por Coletivo TURBA (Paula Motta, Renata Saffer e Roberta de Alencastro)
A pandemia do COVID-19 alterou nossa relação com o espaço público, pois nos impôs medidas de isolamento social. As mulheres, que já enfrentavam diversos desafios na sua rotina nas cidades, como insegurança, assédio e violações; no contexto de retorno às ruas, percebem que esses medos se intensificam com a redução do número de pessoas circulando no espaço público, o caminhar torna-se mais inseguro.
Sabemos que nas periferias das metrópoles, as chefes de famílias são mulheres e provedoras dos seus lares. Mesmo o isolamento sendo aconselhado por órgãos mundiais, muitas necessitam continuar trabalhando e a maioria depende do transporte público para deslocar-se. Em São Paulo, de acordo com a pesquisa Origem e Destino de 2017, 80% dos usuários são mulheres e, segundo a Agência Brasil, em 2019, 97% das mulheres já declararam ter sofrido assédio em transporte público. Podemos observar que as usuárias de transporte público também são pedestres, pois necessitam se deslocar até os pontos de ônibus.
As paradas são locais onde as mulheres se sentem vulneráveis, além da sensação de insegurança no percurso até seu destino. Também se tornam pontos de possível contágio, tendo em vista a formação de pequenas aglomerações de pessoas à espera do transporte.
O projeto Parada Segura é um projeto que surge a partir da perspectiva feminina através da aplicação de ferramentas de urbanismo tático para a resolução de problemas urbanos. Através do engajamento da comunidade local e participação cidadã, a proposta visa ampliar a área de espera da mulher na parada de ônibus, gerando um espaço de estar seguro, informativo e lúdico.
Decidimos atuar em três escalas: macro, do bairro, meso, da quadra e micro da parada de ônibus. Para contemplar a escala do bairro, serão pintadas sinalizações e desenhos informativos sobre segurança em tempos de distanciamento. Já na escala da quadra da parada, as mulheres são guiadas por linhas no piso que informam o distanciamento seguro para a fila de ônibus, assim como para equipamentos próximos, que sejam seguros em caso de desconforto no espaço público, e, para as crianças, pensamos em desenhos lúdicos pintados na calçada para interagirem.
Onde há a parada, optamos por alargar a faixa mais próxima da calçada, através da pintura no piso E adicionamos uma plataforma modular que permite o acesso ao ônibus na mesma altura da calçada. Para um ambiente mais ativo e seguro, projetamos um mobiliário modular móvel em madeira. São cubos de 50cm que terão suas medidas indicadas a fim de informar as distâncias entre as usuárias. Eles podem ser usados de diversas formas: para sentar, brincar, distanciar, informar e permitir a adequação do layout para diferentes situações. Imaginamos também, que alguns podem ser usados para criação de uma hortinha comunitária.
Para gestão da “Parada Segura” propomos o engajamento de mulheres do bairro que serão as responsáveis pelo lugar. Entendemos que empoderando-as será possível manter a parada sempre ativa e a rede de apoio entre elas. Acreditamos que intervenções pontuais que gerem reflexão e, ao mesmo tempo, proposição são essenciais para este momento, sendo adaptáveis a diversas situações. As paradas de ônibus são diferentes em cada cidade, porém o espaço no seu entorno pode ser ativado de maneira similar.
O uso de plataformas e mobiliário modular permite que sejam usadas quantidades distintas a diferentes configurações viárias e de espaço das calçadas. A pintura do piso é feita com base no local e por isso é 100% adaptável. Em Porto Alegre escolhemos o bairro Sarandi para testar a ideia. Localizado no limite norte da cidade, é um dos bairros mais populosos da capital (32hab/ha). Também é considerado um dos bairros mais perigosos e violentos, conforme dados pré-pandemia. Em relação à gênero, 52,48% da população do bairro é mulher e 47,83% das famílias são chefiadas por mulheres. Por isso, entendemos que seria um local adequado para testar essa proposta que envolve diretamente mulheres que necessitam sair de suas casas para trabalhar, ou fazer compras nesse momento pós pandemia.
O plano é fazer contato com as líderes comunitárias a fim de definir o local de intervenção e formar o grupo gestor da intervenção. A ideia é convidá-las a fazer parte desde o início do processo para que validem as necessidades e se tornem responsáveis pelo projeto junto a equipe. Assim, além do local elas podem escolher quais equipamentos e serviços serão indicados nas marcações, em que locais no raio de 400m querem colocar as informações e também poderão ajudar na montagem e pintura da intervenção.
Pranchas de Projeto
Sobre o Coletivo TURBA:
A Turba é um coletivo brasileiro de mulheres que estimula a igualdade de gênero nas cidades através de ações colaborativas no espaço urbano. Atuamos, desde 2018, em projetos que colocam a experiência feminina no centro dos debates, visibilizando, dessa forma, as pautas defendidas para a construção de uma cidade amplamente inclusiva. Os projetos são plurais e abarcam diversas escalas tais como, ações ativistas, educativas, participativas e de pesquisa. Através da nossa atuação buscamos a construção coletiva de projetos replicáveis, pois acreditamos que a construção em rede feminina é a melhor maneira para uma saída coletiva.
Composta por Paula Motta, Renata Saffer e Roberta de Alencastro.
Informação Equipe: Coletivo Turba , Porto Alegre, Brasil / Montevideo, Uruguay
Paula Motta - Arquiteta e Urbanista, Co-fundadora Turba
Renata Saffer - Arquiteta e Urbanista , Co-fundadora Turba
Roberta Gascue de Alencastro - Arquiteta e Urbanista, Co-fundadora Turba
Ana Clara Vera - Arquiteta e Urbanista, Co-fundadora Habitadas
Camila Bellaver Alberti - Arquiteta e Urbanista, Co-fundadora Versa
Contacto: contato.turba@gmail.com
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